DADOS HISTÓRICOS E METODOLÓGICOS
1. TERMINOLOGIA:
A
expressão Leitura Orante (Lectio Divina), significa: leitura divina, leitura
orante, leitura lenta e atenta da Palavra de Deus. É uma maneira orante de
fazer a Leitura da Bíblia, dialogando com Deus a partir de sua Palavra. A Leitura Orante da Bíblia para ser
bem feita, exige atenção, disciplina, assiduidade, humildade, gratuidade e
prontidão para acatar os ensinamentos divinos. E ainda, atenção ao método
proposto (leitura, meditação, oração e contemplação).
A
Leitura Orante não é estudo e nem experiência extraordinária. É um modo orante
de ler a Bíblia, para “escutar o
que Deus tem a lhe dizer, conhecer a sua vontade e viver
melhor o evangelho de Jesus
Cristo”.(Frei Carlos Mesters).
É
colocar-se a disposição de Deus: “Fala
Senhor que teu servo escuta”. (1 Sm 3,10).“Faça-se em mim segundo a tua Palavra”. (Lc1,38).
1.1
CONHECENDO A HISTÓRIA
O Novo Testamento relata a relação profunda de Jesus
com as Sagradas Escrituras, a tal ponto de assumir a Palavra de Deus em sua
vida e missão. Para ele a Palavra tem que ser atualizada no hoje da história
(Sl 21 (22); Lc 4,16-30; 24,13-35; At 8,26-40). A Igreja primitiva, a exemplo
de Jesus, continuou a rezar e a praticar a Palavra, e ainda, pela ação do
Espírito Santo, foi capaz de interpretá-la e reescrevê-la a partir de Jesus Cristo;
a Palavra Encarnada, (Jo 1,14), Nele
se cumpre toda a escritura (Lc 4, 20).
Os Santos Padres, dentre eles se destaca Orígenes,
assumiram a prática da Igreja primitiva, de fazer uma Leitura Orante da
Palavra, e assim, difundiram aos fiéis. Para eles “a Leitura Divina supõe
escuta e resposta”. Outro grupo importante pela prática da Leitura Orante são
os monges. Eram assíduos na meditação, vivendo na intimidade com Deus por meio
da Palavra.
Infelizmente, ouve um período, a partir do século
VIII, em que o povo não teve mais acesso mais Palavra, passando a conhecê-la
quase que unicamente por meio da História Sagrada e das pinturas dos vitrais
das Igrejas. Entretanto, a Bíblia continuava sendo lida e meditada nos
monteiros. Entretanto, a Leitura Orante,
como é conhecida hoje, com seus quatro passos: leitura, meditação, oração e
contemplação, foi sistematizada no século XII, por um monge Cartuxo, chamado
Guido II da ordem cisterciense.
Lamentavelmente,
na Idade Moderna, aconteceu outra crise de ruptura com a Bíblia, tudo passa a
ser interpretado à luz da razão, ou de modo oposto, no fundamentalismo e
sentimentalismo. Porém, Deus que jamais abandona o seu Povo, por meio de seu
Espírito Santo, mobilizou a Igreja através do Vaticano II para que retornasse as
Sagradas Escrituras (DV21-26). Daí pra cá, a Igreja tem conclamado os fieis
para se aproximarem mais da Bíblia, conforme recomendou a Conferência de
Aparecida: “entre as muitas formas de se aproximar da Sagrada Escritura, existe
uma privilegiada à qual somos convidados: a Lectio Divina ou exercício da
leitura orante da Sagrada Escritura. Essa leitura bem praticada conduz ao
encontro de Jesus Mestre” (DA 249). Também o Sínodo da Palavra lembra aos fiéis
a importância de desenvolverem uma intima relação com a Palavra. Cada Igreja
particular tem se empenhado em realizar atividades que concretizem esse
projeto, como tem feito a Arquidiocese de Londrina, que vem estimulado muito a
Leitura Orante da Palavra, através da oração pessoal e comunitária, também, por
meio de retiros, encontros de capacitação da Leitura Orante, reuniões dos
Grupos Bíblicos de Reflexão, Escolas Bíblicas e Teológicas.
1.2 Os quatro
passos da Leitura Orante segundo Guigo II
A leitura oferece o material para a meditação. A assimilação da meditação leva a
oração e a oração provoca a contemplação, segundo a qual, o fiel passa a ver o
mundo com os olhos de Deus, ou seja, se compromete, tornando-se discípulo
missionário.
Leitura
(Lectio): É o primeiro degrau da
escada. Ela se propõe a responder a seguinte questão: O que o texto diz em si? É um processo lento, onde o leitor
precisar ler várias vezes o texto, até se familiarizar com a Palavra, sendo
capaz de contar espontaneamente o texto lido. Nesse passo, recomenda-se que se
observe as palavras chaves, os verbos, as palavras repetidas, podendo grifar a
expressão que mais chamou a atenção. Ao ler o texto sagrado não se pode
desconsiderar o contexto em que foi escrito. Faz-se necessária uma leitura
atenta e lenta para não manipular o texto, considerando os três níveis:
literário, histórico e teológico.
“No
nível literário vai-se analisar o
texto, descobrindo a sua relação com o contexto literário. Algumas perguntas
podem ajudar como: Quem? O que? Por quê? Quando? Como? Com que meios? Como o
texto se situa dentro do contexto literário do livro de que faz parte? No nível histórico vai-se buscar conhecer
o contexto nos aspectos: político, social, econômico, ideológico, afetivo,
antropológico e outras. Procura-se descobrir quais os conflitos que estão por
traz do texto ou nele se refletem para, assim, perceber melhor a encarnação da
Palavra de Deus na realidade conflitava humana, tanto do povo do Bíblia como
nossa. No nível teológico vamos
procurar saber o que Deus tinha a revelar naquele tempo e como o povo
respondia, assumia e celebrava a Deus. Busca-se o sentido de cada palavra.
Aconselha-se a usar alguns recursos como: comentários, notas de rodapé,
dicionário”... Depois de se ter obtido todas essas informações, quando se sente
interrogado pela Palavra, então chegou o momento de se passar para o segundo passo.
Meditação (Meditatio): É o segundo degrau da escada orante, o momento de
atualizar a Palavra. A Leitura Orante, é como um espelho, que reflete o passado
no presente, no chão concreto do dia-a-dia. A meditação busca uma resposta
iluminadora para a vida a partir do próprio texto sagrado. “O que o texto me (nos) diz hoje”? Propõe-se uma reflexão profunda, e interpeladora
como fez Maria (Lc 2,19. 51). A Palavra faz uma conexão entre o texto e a vida,
entre nós e Deus. Algumas perguntas
podem ajudar como: “Qual é para mim a idéia e o valor fundamental do texto
lido? Por que é importante? O que me sugere e como me questiona? Com qual
personagem me identifico? Que sentimentos e atitudes me transmitem? Como posso,
com esses pensamentos, iluminar minha vida? Trata-se de deixar que a Palavra
penetre profundamente na intimidade do meu coração, e depois mobilizar todas as
energias para confrontar-se, ir dentro da Palavra e converter-se a ela. A
meditação indica o esforço que se faz para atualizar o texto e trazê-lo para
dentro do horizonte da vida e realidade, tanto pessoal como social”. Outro modo
de meditar é “ruminar” a Palavra, repetindo várias vezes o versículo que mais
chamou a atenção, saboreando-a até que ela ilumine a missão (Ez 3,1-3). A
meditação nos ajuda a compreender, pela ação do Espírito Santo, o próprio Deus
(2 Tm 3,16), e a entender o sentido pleno da Palavra (Jo 16,13). Quando a
Palavra provoca desejo de falar com Deus, então chegou o momento de subir mais
um degrau.
Contemplação
(contemplatio): É o último degrau da escada. Para a
tradição da Leitura Orante, a contemplação é o ápice, o ponto alto do método, é
o resultado da assimilação da Palavra de Deus no coração humano. Leva a dar uma
resposta a Deus assumindo compromissos de acordo com a Palavra: “O que o texto me (nos) leva a viver”? A contemplação é o resultado dos três primeiros
passos, é como a seiva de uma planta, é a doçura, o sabor, o que restou da
leitura, meditação e oração. É a hora de fixar o olhar em Deus (Sl 25,15a),
deixando-se abraçar por Ele (Lc 15,20). A contemplação não requer palavras, mas
um silêncio contemplativo. Ela convida a conversão, ao compromisso, ela leva a
ação.
Ir. Solange
das Graças Martinez Saraceni, ICP
REFERÊNCIA:
BIANCO, Enzo. Lectio Divina: encontra Deus na sua
Palavra. São Paulo: Salesiana2009;
CONFERÊNCIA DOS RELIGIOSOS
DO BRASIL. A Leitura Orante da Bíblia.
São Paulo: Loyola, 1990;
MESTRES, Carlos; BROLLO, Elda. Leitura Orante da Bíblia: São
Paulo: Paulinas, 2008 (Florder);
ZEVINI,Giorgio. A Leitura Orante da
Bíblia. São Paulo: Salesiana, 2006.
0 comentários:
Postar um comentário